No meio dos concursos, é comum uma certa celeuma entre o estudo dedutivo e o estudo indutivo, a qual acaba, no final das contas, por minar a confiança de cada um dos lados. Nesse sentido, penso que ter consciência do terreno no qual está pisando parece ser um bom caminho para se manter disciplinado e persistente.
Essa nomenclatura “filosófica” (“dedutivo” e “indutivo”) eu proponho aqui na falta de um termo melhor e são apenas “tipos ideais”, isto é, extremos criados para facilitar a análise, havendo diversas combinações (algumas mais inclinadas para o extremo “dedutivo”, outras para o extremo “indutivo”).
Por um lado, o estudo DEDUTIVO é aquele que parte da ideia geral para especificar, prezando por maior encadeamento de premissas. Em geral, quem preza por esse método não gosta de estudar um tema solto, ler uma lei penal específica sem dominar antes a teoria geral do crime.
Por outro lado, o estudo INDUTIVO é mais casuístico, vai do menor para o maior, sem grande preocupação com um grande encadeamento de premissas. Por ex., ao analisar a Lei de Licitações por meio de site de questões, percebe-se que apenas alguns dispositivos são cobrados, de modo que, com essa constatação, passa a dispensar a leitura tanto da lei integral quanto do aspecto doutrinário/jurisprudencial dela. É mais "bombeiro": ataca as vulnerabilidades constantemente.
Não há um método “aprioristicamente” melhor: ambos têm as suas vantagens e desvantagens, de maneira que o cálculo do custo-benefício sempre é pessoal. O estudo DEDUTIVO tem a vantagem de fornecer visão global e maior articulação dos temas. Um exemplo concreto (e extremo) é a leitura integral dos livros de concurso, leis e informativos, de sorte que vulnerabilidades temáticas são praticamente inexistentes. Flerta, assim, com maior capacidade de contextualizar temas e maior fluência do raciocínio jurídico, o que, de certa maneira, tem maior relevância na prova ESCRITA e ORAL.
Na fase objetiva, essa articulação ajuda não apenas na prova (nas inferências quando não se tem a memória específica do indagado, facilitando o ato de filtrar as alternativas), mas também para a melhor compreensão do texto legal.
O ponto negativo do estudo DEDUTIVO é a maior demora para executá-lo, de modo que pessoas impacientes dificilmente conseguirão se manter disciplinadas e persistentes. Além disso, há uma tendência comum de querer se aprofundar mais, o que, em algum momento, precisará de freio, já que, enquanto os temas têm profundidade infinita e se (des)atualizam constantemente, a nossa memória em provas se mostra FALHA e FINITA (e provas cobram mais o horizontal do que o vertical)..
O estudo INDUTIVO tem a vantagem de contemplar “aquilo que cai”, como o estudo reverso ou qualquer estudo que tome como de partida (e não de mera revisão) a feitura de questões. Tende a se guiar por muitos filtros, construído à luz do viés de “utilidade imediata”.
A profundidade buscada, assim, é feita a partir de juízo de prognóstico: se X e Y são cobrados muito, enquanto Z é cobrado pouco e W nunca é cobrado, estudarei X e Y, preterindo Z e W. A vantagem é trazer resultados mais imediatos por limitar significativamente o objeto de estudo, viabilizando maior contato com pontos de provável cobrança.
O ponto negativo do estudo INDUTIVO é a menor capacidade de articular temas (eles ficam mais “soltos” e “fragmentados”, pois Z e W serão ignorados AINDA que sejam a premissa de X e Y) e será mais eficiente se, e somente se, souber se guiar pelos filtros (saber o que mais cai, o que deve ser aprofundado, etc.). Além disso, a fragmentação do estudo é mais sentida, evidentemente, em provas escritas e orais, que exigem maior contextualização dos temas. Não bastasse isso, diferentemente da prova objetiva (na qual Z é pouco cobrado e W nunca é cobrado), a prova escrita e oral têm uma quantidade menor de perguntas/temas e podem atacar justamente o ponto fraco: Z e W. A probabilidade é menor, mas existe.
Comparando os métodos, o INDUTIVO tem maior precisão (sobretudo em lei seca, que é o que mais cai), mas, como prejuízo e presumindo todo o mais constante (ignorando eventual profundidade adquirida na vida profissional ou faculdade), tem menor articulação de temas e maior vulnerabilidade temática.
Embora ambos tenham as suas (des)vantagens e possam ser mesclados, há uma certa pecha atribuída a ambos os métodos: por um lado, quem é dedutivo tende a achar o indutivo um “atalho” e que “estuda apenas para uma fase” (“ele cresce o ponto na objetiva mais rapidamente, mas a conta vai chegar mais tarde, já que a prova não tem apenas a fase objetiva”); por outro lado, quem é indutivo, em geral, acha o estudo dedutivo “mais romântico”, “pouco pragmático” e que “não é isso que é aferido em provas”.
A luta de rótulos é bem inútil, porque ambas as estratégias têm êxitos concretos e reais.
Em todo caso, destaco que, no mundo dos concursos, as mentorias, em geral, são mais INDUTIVAS (criam cronograma de leitura fragmentada daquilo que é mais cobrado, com muitos rompimentos temáticos). E, por razão de mercado (dolus bonus c/c conflito de interesses) e/ou por sinceramente acreditar em hierarquia de métodos, é perceptível que há uma certa tendência em tachar quem lê livros inteiros, faz resumos escritos e não faz questões, seja dizendo que “não vai passar!”, seja adjetivando de “gênio” quem passou assim (a aprovação da pessoa, no caso, veio APESAR do método executado, e não em RAZÃO DE TER executado aquilo que funcionou para ela).
Em razão desse barulho, há uma certa invisibilidade de métodos não muito "mercantis" e, por essas e outras razões, vejo muitas pessoas com receio de confiar na forma de estudar, principalmente aquelas que são mais dedutivas. Com isso, muitos são seduzidos pelo canto da sereia da melhoria rápida em provas objetivas, o que, de fato, tende a ocorrer para quem executa algo mais INDUTIVO.
Eu procuro, na medida do possível, ser um pequeno exemplo contramajoritário de alguém que, executando um método dedutivo (não fiz
questões, li livros inteiros, resumi por escrito, não intercalei matérias e fiz provas de carreiras diversas), alcançou bons resultados, sem qualquer pretensão de, aqui e ali, maximizar as minhas experiências ou colocá-las como “a última ciência”. São nada mais do que experiências e dilemas reais, que podem fazer maior ou menor sentido para cada pessoa em sua singularidade. A minha trajetória, enfim, foi apenas mais uma experiência exitosa no meio de tantas outras, umas mais dedutivas, outras mais indutivas.
Nesse panorama, o que me parece relevante é ter consciência que o DEDUTIVO tem maior domínio/contextualização, mas precisa saber filtrar em certa medida, do contrário o infinito/perfeccionismo pode sobrecarregar demais a memória; e o INDUTIVO tem maior fôlego para provas objetivas, mas tem maior número de vulnerabilidades temáticas e de contextualização comparativamente falando.
Como um ser humano autônomo e que vai vivenciar/sofrer as consequências de suas decisões, tenha consciência do custo-benefício das suas escolhas, sem, simplesmente, terceirizar algo tão relevante na sua vida: a forma pela qual lutará pela carreira de seus sonhos. Se você é mais dedutivo, mas insiste no método indutivo, poderá se frustrar a cada bateria de questões realizadas sem nunca ter lido o tema e tenderá a apresentar maior ansiedade em provas escritas e orais; se você é mais indutivo, mas insiste no método dedutivo, tenderá a ficar desanimado com o estudo muito lento, sem edital à vista e sem resultados concretos imediatos (com a nota estagnada em provas e sites de questões).
Se você já executa algo que se compatibiliza mais com o seu perfil e, mesmo assim, se sente receoso com o ponto vulnerável, um caminho amplamente validado (usado pela maioria dos aprovados, conforme pesquisa do @magistraturaestudalemfoco) é fazer questões (para frear o “infinito” de quem é DEDUTIVO) e ler a parte introdutória dos capítulos das sinopses/doutrinas (para suprir a falta de contextualização do estudo INDUTIVO, com classificações, conceitos, etc).
O importante, em última análise, para os dois métodos e suas combinações, é obter RESULTADOS, e não apenas executar um “script”. Método, mesmo na ciência, não é feito sem uma finalidade: é direcional. É apenas uma forma de se aproximar de um objeto para descrevê-lo. Nos concursos, é uma forma de domar o caos de informações e construir habilidades exigidas pela banca em certo contexto: precisão (prova objetiva), articulação de raciocínio (prova escrita) e comunicação sob pressão (prova oral).
E ambos os métodos e suas combinações, sem dúvida, são capazes de produzir esses resultados, mas isso funcionará melhor se respeitarmos nosso ponto de partida e perfil de aprendizado! Por essas e outras é um mantra dos aprovados: "faça aquilo que funciona para você"! No final das contas, como já disse, ninguém quer saber se o Messi treina de manha ou à noite, se intercala ou não, se grifa ou resume, se vê vídeos ou não: o que interessa é o resultado!
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