Trajetória nos concursos - Por Larissa Camapum de Souza

By | outubro 03, 2020 3 comments

  


Trago hoje a emociante trajetória de Larissa Camapum, agora promotora em MPMG (concurso encerrado em 2020)! O tempo de abdicação dos concursos é um momento de grande aprendizado: aprendizado de perceber que as coisas não vêm no tempo que desejamos, aprendizado de que às vezes superestimamos nosso planejamento (acreditando que conseguimos conciliar tudo: abdicação, trabalho, planilhas etc)... e foi assim, com perda familiar e persistência, que a aprovação foi brilhando na janela da Larissa! Como ela bem disse a Larissa, "o mundo dos concursos tira muitos momentos da gente e dessa vez tirava até mesmo o meu tempo de luto". E continua: "costumava ler em relatos de aprovados que 'tudo tem o seu tempo' e confesso que achava uma tremenda bobagem, já que eu ficava pensando que seria muito fácil acreditar nessa frase com a certeza da aprovação. [...] Em breve, serei Promotora de Justiça, no estado que meu namorado trabalha há mais de um ano, não como sempre sonhei, mas sim tal como a trajetória me mostrou que era o que deveria ter sonhado! A realidade pode realmente ser bem melhor que qualquer sonho concurseiro...". Uma baita lição de vida! Parabéns, Larissa! Muitas felicidades no MPMG!

Primeiramente, gostaria de agradecer o Júlio pelo convite de contar um pouquinho da minha história. Acompanho o instagram dele desde o começo e acho que perdi as contas de quantas vezes me imaginei escrevendo minha trajetória nesse espaço (opa, caiu um cisco aqui!). Nos conhecemos pessoalmente no início desse ano no  curso de preparação para a prova oral do MPSP. Mas até chegar nessa fase muita coisa aconteceu....


Durante a faculdade eu pensava em prestar concurso público para a magistratura, mas não cheguei a me dedicar aos concursos nessa época. No ano de 2011 inclusive fiz intercâmbio acadêmico para a Espanha, o que fez minha graduação durar seis anos e não cinco.


Me formei em 2015 e quase imediatamente ingressei no mestrado na minha universidade (UFG). Sempre tive vontade de lecionar e como estava sem trabalho no momento achava que seria bem tranquilo fazer mestrado e estudar para concursos... Ledo engano! Já na primeira semana percebi que o mestrado era muito mais exigente que a graduação. Como não tínhamos aulas todos os períodos, consegui trabalho em um escritório e  resolvi conciliar com o mestrado.


Sempre gostei do curso de Direito e gostava muito de advogar. Costumava falar que se advogar fosse só a parte jurídica, eu jamais teria largado. O problema é que envolve todo um trato com clientes, não só de captação como também de manutenção e essa parte me incomodava bastante.


Então, terminei o mestrado no meio do ano de 2017 e comecei a estudar para ser Juíza, afinal, era o meu sonho desde a graduação, ainda que adiado por algum tempo. Continuei advogando na parte da manhã de forma voluntária após terminar o mestrado e durante o ano de 2018 em um escritório para continuar a prática jurídica e também para me manter dentro do universo da advocacia (afinal, imagina se eu não passasse nunca, né?!).


Esse começo dos estudos foi muito animador pra mim, pois fui adquirindo um rápido avanço nas primeiras fases e após um ano de estudos consegui ir para a segunda fase do TJMG (2018). Além disso, minha preocupação até então era “só estudar” e como pode ser visto em diversas trajetórias já mostradas por aqui isso é um verdadeiro privilégio...


Passar de forma rápida para as fases seguintes tem ônus e bônus. Um ponto positivo é ter  experiência em uma fase muito diferente da primeira. O negativo foi que perdi alguns meses (e bastante dinheiro) completamente dedicada em aprender as técnicas de sentenças e humanística  quando, na prática, eu ainda estava longe de ter real possibilidade de passar em um concurso desse nível. Se nessa época eu tivesse passado, seria apenas uma questão de muita sorte. Fui muito bem na prova discursiva (aquela que pediu o conceito de equiprimordialidade em Habermas), mas só por causa da bagagem que eu tinha do mestrado, na sentença cível consegui passar raspando, mas a sentença penal me mostrou que ainda faltava um longo caminho a ser percorrido.


Logo após essa prova, fiz as primeiras fases do TJSP (fim de 2018) e TJPR (2019). Fui bem confiante achando que se passei para a segunda fase meses antes, com certeza passaria nessas provas. Mais um engano na vida da concurseira iniciante... Vários meses sem me dedicar à leitura da tão importante lei seca fizeram meu desempenho regredir bastante, sendo que no TJSP consegui a pior nota da minha vida em primeiras fases.


Assim, comecei 2019 reprovando no TJPR e já não estudando tão otimista como antes. Estava na fase de achar que era impossível conciliar a leitura da lei seca com o avanço nas doutrinas e que jamais conseguiria fechar o edital (nisso eu estava certa, aprovei, mas não fechei). Como estava bastante estressada, resolvi sair do escritório e advogar apenas em causas de familiares e amigos.


Foi então que saiu o edital do MPSP com prova em meados de 2019 e decidi fazer, porque o estado tinha boas perspectivas profissionais para o meu namorado (sempre tentei conciliar nossas ambições profissionais, então evitava prestar provas em estados que não fossem bons para ambos). Nunca tinha estudado para o MP, mas resolvi arriscar. Para a minha surpresa, fui muito bem na primeira fase.


Estudando para essa segunda fase, meu encantamento pelo Ministério Público surgiu e voltei a estudar muito animada. Percebi que meu dia favorito de estudos era o de estudar Direitos Difusos e me dediquei o máximo que podia. Enfim, estudava com a empolgação do início dos estudos novamente! A prova foi no ínicío de setembro.


No fim de setembro minha vida virou de pernas pro ar. Sempre fui muito grudada na minha avó paterna, ela era minha vizinha e nos meus períodos livres durante toda a trajetória de concursos eu sempre a visitava. No final de setembro, minha avó amanheceu sem conseguir falar as palavras, foi como se tivesse se esquecido de como falar. Descobrimos que estava com sete tumores no cérebro e que ela sobreviveria no máximo 2 meses. Meu mundo caiu.


Nessa mesma época saíram os editais do MPGO e do MPMG. Fiz minha inscrição antes de saber da doença, porque se não nem tinha feito. Estava numa fase completamente desanimada com os estudos, mas continuava estudando todos os dias, ainda que ao final de cada um deles sentisse que não estava aprendendo muita coisa.


No dia 24/11/2019, de madrugada, meus pais me ligaram e comunicaram o falecimento da minha avó. Ao despedir, meu pai me disse: “Já olhamos e você não consegue chegar a tempo no velório em Goiânia nem de avião e nem de ônibus, vá fazer a prova, sua avó com certeza gostaria que você fizesse”.  Eu estava em BH com meu namorado (ele estava morando lá) e iria fazer a prova do MPMG em poucas horas... Passei a noite acordada, mas fui fazer a prova de manhã.


Três dias depois saiu o resultado do MPSP: aprovada para a fase oral e uma semana depois fiz a prova do MPGO.  Eu sentia um misto de sentimentos: felicidade com o MPSP e ao mesmo tempo uma revolta interior - o mundo dos concursos tira muitos momentos da gente e dessa vez tirava até mesmo o meu tempo de luto.


Os meses de janeiro e fevereiro de 2020 correram como se eu estivesse em “modo automático”: inscrição definitiva, provas de segunda fase do MPGO e do MPMG, inúmeros cursinhos de prova oral para o MPSP.


Se em fevereiro eu começava a me sentir melhor de novo após esses resultados positivos e ao ir me conformando com a perda da minha avó, em março a notícia de reprovação na prova oral do MPSP foi mais um duro golpe na minha trajetória dos concursos. Por duas semanas sonhei todos os dias com a minha arguição e comecei a desenvolver um sentimento de que prova oral não era pra mim. Parei de estudar no restante de março – foi a primeira e única vez que não estudei em toda a caminhada por tantos dias seguidos.


No início de abril, já com a pandemia instalada e percebendo que agora seria mais difícil ainda pra todo mundo, voltei aos estudos. Com uma semana, saiu a notícia de minha aprovação para a fase oral do MPMG. Acho que fiquei mais feliz nesse dia do que quando saiu o resultado final. Senti uma gratidão muito grande ao meu pai por ter insistido para que eu fizesse a primeira fase.


Dessa vez, não fiz muitos treinos com os colegas e nem muitos cursinhos. Como eu me sentia traumatizada com a prova oral, resolvi evitar ao máximo as simulações desse momento pra conseguir estudar em paz as várias matérias específicas do MP, sobretudo do MPMG, as quais eu nunca tinha lido na minha vida.


Minha preparação específica para a fase oral consistiu em ler minhas anotações do Júlio (que deu o melhor curso de prova oral dos que fiz) e treinos apenas duas semanas antes da prova. E não é que deu certo?


Em breve, serei Promotora de Justiça, no estado que meu namorado trabalha há mais de um ano, não como sempre sonhei, mas sim tal como a trajetória me mostrou que era o que deveria ter sonhado! A realidade pode realmente ser bem melhor que qualquer sonho concurseiro...


Costumava ler em relatos de aprovados que “tudo tem o seu tempo” e confesso que achava uma tremenda bobagem, já que eu ficava pensando que seria muito fácil acreditar nessa frase com a certeza da aprovação.


Jamais imaginaria fazer prova oral no meio da pandemia, com transmissão pelo youtube e, ainda, que aquela primeira fase feita poucas horas após o falecimento de minha avó seria a primeira fase mais marcante da minha vida não só por um fato ruim, mas por ter sido a prova da minha aprovação.


Sim, tudo tem o seu tempo. E o “tempo certo” pode acontecer quando tudo leva a crer que é o “tempo errado”...


Melhorei muito do MPSP para o MPMG (com uma diferença de quatro meses entre as provas)? Não, só não era o tempo certo.


Dito isso, por mais que estejamos vivendo um tempo de tantas incertezas, que tanto leva a crer o tempo todo que é o “tempo errado”,  o que resta é fazer o que tem que ser feito todos os dias – motivado ou não, porque ninguém sabe quando o errado vai virar certo na própria trajetória.

 

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